Juristas avaliam PEC que limita decisões monocráticas do Supremo
- 20/10/2023
O Senado Federal ouviu, nesta quinta-feira (19), juristas
sobre o teor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/21 que, se aprovada
em caráter terminativo, limitará as decisões monocráticas e os pedidos de vista
de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
A matéria foi aprovada pela Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) do Senado no início de outubro, seguindo então para a análise do
plenário.
Em termos gerais, os juristas avaliaram positivamente o
texto da PEC, ainda que algumas ressalvas tenham sido feitas a prazos previstos
no texto. Eles ressaltaram também a necessidade de abrir espaço para mais
debates, de forma a viabilizar o aprimoramento de seu texto, em especial no que
se refere a segurança jurídica.
Proposta
A PEC 8/2021 proíbe decisões monocráticas que suspendam a
eficácia de lei ou ato normativo com efeito geral, ou que suspendam atos dos
presidentes da República, do Senado e da Câmara dos Deputados. Também ficam
proibidas decisões monocráticas com poder de suspender a tramitação de
propostas legislativas, que afetem políticas públicas ou criem despesas para
qualquer Poder.
Além disso, restringe os pedidos de vista para serem de
caráter coletivo e “limitados a seis meses e, em caso de excepcional renovação,
a três meses, sob pena de inclusão automática do processo em pauta, com
preferência sobre os demais”.
Decisões monocráticas são aquelas tomadas por apenas um
magistrado. Trata-se de uma decisão provisória, que precisa ser confirmada pelo
conjunto dos ministros da Corte. Já o pedido de vista ocorre quando um ministro
pede para analisar algum tema em julgamento, suspendendo a análise do processo.
De acordo com o texto, caso o STF esteja em recesso, será
permitida decisão monocrática em casos de grave urgência ou risco de dano
irreparável. No entanto, este tribunal terá prazo de até 30 dias para julgar o
tema, após a retomada dos trabalhos.
Sobre decisões cautelares para controle abstrato de
constitucionalidade (decisões tomadas por precaução, para evitar efeitos de
atos que possam ser considerados inconstitucionais), a proposta estabelece
prazo máximo de 6 meses para julgamento da ação. Após esse prazo, a ação terá
prioridade na pauta do Supremo.
O relator da matéria, senador Esperidião Amin (PP-SC), diz
que as mudanças não retiram prerrogativas dos ministros do STF, mas trazem
regramento e racionalização para o instituto do pedido de vista.
Celeridade
No debate de hoje, Amin lembrou que até dez ministros podem fazer pedido de vistas dos processos, e que isso pode resultar em uma demora de até 900 dias para que a matéria seja retomada. Com a PEC nº 8/21, o prazo máximo fica reduzido a até 270 dias (6 meses para a vista coletiva, renovável por mais três meses, caso haja divergência).
“Até dez ministros podem fazer pedidos de vista. [Com a
aprovação da PEC,] estaremos nos prevenindo, para que haja um prazo menos
esdrúxulo do que estes 900 dias”, argumentou o relator.
Professor da faculdade de Direito da Universidade Federal do
Paraná, Ílton Norberto Filho disse nunca ter visto uma situação em que todos
ministros do STF pediram vista. “Há situações com três, ou um pouco mais, mas
não é uma situação corriqueira”, disse o jurista.
“Penso que a PEC tem inúmeros pontos positivos. É uma
discussão bastante necessária e oportuna, mas penso que necessitaria de mais
reflexão”, acrescentou, ao sugerir que a matéria seja largamente debatida,
antes de ser votada, e que os parlamentares revejam alguns prazos previstos no
texto.
Questões técnicas
Segundo Norberto Filho, alguns dos prazos são inviáveis e
devem ser mais discutidos. “O tempo da política é diferente do tempo do
direito. Parece que algumas questões têm de ter um pouco mais de tempo para se
debruçar. Tenho uma dificuldade com prazos assim, tão curtos no que diz
respeito à concessão de cautelar e de seis meses para julgamento”, acrescentou.
Na avaliação do jurista, há uma série de questões técnicas que deveriam ter um
pouco mais de aprofundamento.
Primeiro signatário da proposta, o senador Oriovisto
Guimarães (Podemos-PR) lembrou que a PEC foi apresentada inicialmente em 2019 e
que já foi amplamente debatida entre os parlamentares. “O que estamos colocando
aqui é um disciplinamento de várias questões. Decisões monocráticas podem até
suspender vigência de leis, e podem durar meses e anos para o julgamento de
mérito”, disse o senador, ao garantir que a matéria não pretende quebrar a harmonia
entre os poderes.
“Não há aqui nenhum espírito de disputa ou de tirar poderes
do Supremo. Tenho absoluta convicção de que, se aprovarmos essa PEC, ela trará
um grande benefício à nação brasileira e um grande benefício à imagem do nosso
STF. Deixaremos de ter 11 Supremos e teremos efetivamente um, para a segurança
e para o bem da nossa nação”
OAB
Representando a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o
jurista Nabor Bulhões disse que, em termos de controle de constitucionalidade,
a Suprema Corte brasileira é o tribunal mais poderoso do mundo. “Nenhum outro
sistema tem tantos mecanismos de controle [de constitucionalidade]”, disse.
“Quem tem o poder de exercer esse controle de
constitucionalidade com essa amplitude tem também o dever da autocontenção, um
dos predicados mais importantes de uma Suprema Corte. Afinal, no contexto dos
poderes independentes e harmônicos, é o Judiciário que dará a última palavra,
por exemplo, sobre a constitucionalidade. Portanto, quem tem esse poder tem de
ter muita cautela, e tem de ter muita autocontenção”, argumentou.
“Nós, da OAB, entendemos que a proposta é pertinente e é,
além de tudo, constitucional. Ela estabelece regras muito claras para a
concessão de medidas cautelares, não excluindo a possibilidade de as cautelares
serem concedidas monocraticamente em regime de plantão, mas com a
obrigatoriedade de sua submissão ao plenário em um tempo razoável”,
complementou.
Aprimoramento
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de
Brasília (UnB), Miguel Godoy argumentou que o Legislativo pode estabelecer um
contrapeso em relação ao Judiciário. Para Godoy, o debate sobre essa matéria
ajudará todos na análise da PEC, “sob a melhor luz: a luz do aprimoramento e
correção de disfuncionalidades”.
“O desafio que nos move aqui hoje é responder a seguinte
pergunta: como pode o Poder Legislativo estabelecer um contrapeso às
disfuncionalidades que marcam o STF atualmente? Como estabelecer um mecanismo
de aprimoramento institucional que, de fato, contribua para o funcionamento
harmônico entre os poderes?”, questionou.
Segundo Godoy, a PEC 8/21 “é a melhor resposta produzida até
aqui”, uma vez que limita o poder monocrático dos ministros do Supremo, mas sem
reduzir a sua autoridade. Além disso, acrescenta o jurista, a PEC regula o
pedido de vista, “impedindo que ele se transforme no famoso perdido de vista”,
e aprimora a gestão de tempo dos julgamentos.
Sugestões
Miguel Godoy propôs algumas sugestões de aprimoramento do
texto. Primeiro, que coloquem, ao final, que os prazos nela estabelecidos são
dias corridos." Acho que vale a pena deixar isso mais claro porque a regra
geral é de que os prazos sejam contados em dias úteis”, disse.
Ao abrir a sessão temática, o presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), disse que o debate tem o propósito de aprimorar o sistema
jurisdicional. “Os Três Poderes têm, cada um, funções, particularidades e
deveres perante a sociedade, e podem sempre evoluir e aperfeiçoar sua atuação.
Seja por iniciativa própria, seja com a contribuição de outro poder”,
acrescentou.
Com Inf: EBC |Foto: Lula Marques/ Agência Brasil
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