Debatedores defendem Bolsa Família como primeiro passo para renda mínima
- 26/04/2023
Representantes da sociedade civil defenderam nessa
terça-feira (25) a aprovação da medida provisória que recria o Programa
Bolsa Família como um passo importante para assegurar a todos os brasileiros o
direito a uma renda básica. O debate foi promovido pela comissão mista que
analisa a MP 1.164/2023.
Eles sugeriram alterações na proposta e divergiram sobre o
trecho que suspende empréstimos consignados para quem recebe o Benefício da
Prestação Continuada (BPC).
Publicado no Diário Oficial da União no dia 2 de março, o
texto estabelece o valor mínimo de R$ 600 para as famílias cadastradas no
programa, mais R$ 150 por criança de até seis anos e R$ 50 por dependente entre
sete e 18 anos ou gestante. São elegíveis famílias com renda de até R$ 218 por
pessoa.
Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro
Ferreira afirmou que o texto proposto pelo governo pode ser aprimorado para
incorporar, na prática, diretrizes de uma renda básica.
— O Bolsa Família pode ser concebido como um primeiro passo
na direção da renda básica universal e incondicional — disse.
Entre as alterações sugeridas por ele está a obrigatoriedade
de atualizar os valores do Bolsa Família periodicamente e o impedimento de
formação de fila na concessão do benefício.
— Ninguém deve ficar sem o benefício por mais de 40 dias se
estiver dentro dos critérios estabelecidos na futura lei — afirmou.
Ele propôs ainda a suspensão imediata de bloqueios
simplesmente porque o beneficiário não cumpriu as condicionantes.
— Como é que pode alguém chegar no posto de saúde para tomar
vacina, não ter vacina e ele ter o benefício cancelado por conta disso? —
acrescentou.
O novo Bolsa Família retoma o modelo original com a
exigência de contrapartidas das famílias beneficiadas pelo programa, que
voltarão a ter que comprovar a frequência escolar dos filhos e a manter
atualizadas as cadernetas de vacinação da família inteira. Grávidas
deverão fazer o acompanhamento pré-natal.
As contrapartidas deixaram de ser cobradas durante o governo
de Jair Bolsonaro, que substituiu o Bolsa Família pelo Auxílio Brasil.
Proteção social
A representante do Conselho Federal de Serviço Social
(CFESS), Aldaíza Sposati, criticou o fato de os beneficiários do programa não
terem participado da elaboração da medida provisória. Para ela, a proposta tem
um caráter mais fiscal do que social.
— Nós, assistentes sociais, temos sido convocados para ir às
casas das pessoas verificar se o que elas dizem é de fato verdade — disse.
Ela ressaltou ainda que a maioria dos 55 milhões de
beneficiários do programa (67%) são mulheres, mães, pardas ou negras, e
lamentou, por conta disso, o fato de algumas condicionantes do programa
atingirem mais diretamente mulheres e crianças.
Vice-coordenador da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania
e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), Renato Carvalheira citou dados
do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar na Pandemia de Covid-19 no
Brasil, segundo os quais 33 milhões de pessoas vivem em insegurança alimentar
no país, podendo chegar a 125 milhões se considerada alguma insegurança
alimentar.
— A questão de renda tem um impacto grande na questão da
fome. Quanto mais recursos tem a família, mais a fome tende a diminuir —
disse.
Segundo Carvalheira, a refeição que as pessoas mais pulam é
o jantar.
— As pessoas vão dormir com fome.
A expectativa é que o parecer do relator, deputado Dr.
Francisco (PT-PI), sobre as 257 emendas apresentadas à medida provisória seja
discutido e votado no dia 3 de maio.
— Embora saibamos que a discussão sobre a renda básica já
pode ter alguns gatilhos na medida provisória, precisamos considerar outras
variáveis, como o novo marco fiscal, a reforma tributária, para que a gente
possa aperfeiçoar o PPA e outros instrumentos orçamentários — disse o relator.
Empréstimo consignado
O presidente da Associação Nacional dos Profissionais e
Empresas Promotoras de Crédito e Correspondentes no País (Aneps), Edison Costa,
e o deputado Capitão Alberto Neto (PL-AM) defenderam mudanças na MP para voltar
a permitir o empréstimo consignado a beneficiários do BPC.
— A suspensão do empréstimo consignado empurra o
beneficiário do BPC para taxas dez vezes maiores, de 20 a 25%. Você não o
proibiu de tomar empréstimo, fechou o melhor caminho — disse Costa.
— O público tem reclamado da retirada do BPC. Muitos alegam
que precisavam de crédito e foram obrigados a pegar com juros mais altos do que
o consignado — acrescentou o deputado.
Para a representante do Conselho Nacional de Assistência
Social (CNAS), Eutália Barbosa, permitir que essa parcela da população
comprometa 40% da renda com o sistema financeiro traz mais vulnerabilidade do
que proteção.
— Nós defendemos transferência de renda como uma alternativa
de proteção social dentro de uma sociedade desigual. Não podemos misturar
o debate do consignado com proteção social — disse.
Renda básica
Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o
Poder Executivo deverá implementar, conforme prevê a Lei Suplicy (Lei 10.835,
de 2004), programa de renda básica de cidadania para as pessoas em situação de
extrema pobreza e pobreza, com renda per capita inferior a R$ 89 e R$ 178,
respectivamente.
Pioneiro na defesa de programas sociais destinados a acabar
com a miséria e a fome no país, o ex-senador e hoje deputado estadual por São
Paulo Eduardo Suplicy (PT), que participou da audiência, destacou por que a
renda básica de cidadania é ainda melhor do que o Bolsa Família.
— Eliminamos qualquer burocracia em relação a quanto a
pessoa ganha. Nesse sentido, a renda básica de cidadania vai elevar o grau de
dignidade e liberdade real para todos — disse Suplicy, autor de projeto que
originou a lei.
A Lei Suplicy trata do pagamento de “benefício monetário”
sem especificar valor. A decisão do STF também não trata disso, mas determina
ao Poder Executivo que adote todas as medidas necessárias para a implementação
da renda básica, inclusive mediante alteração do Plano Plurianual (PPA) e das
leis orçamentárias.
Com Inf: Agência Senado | Foto: Roque de Sá/Agência Senado
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