6 em cada 10 crianças e adolescentes vivem na pobreza no Brasil, diz Unicef

  • 14/08/2018

Trinta e dois milhões de crianças e adolescentes brasileiros (ou 61%) são afetados de alguma forma pela pobreza. É o que aponta um estudo divulgado nesta terça-feira (14) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2015.

A pesquisa abrange os efeitos monetários (renda insuficiente), mas também a privação de direitos como à educação, informação, moradia, saneamento e água, bem como o problema do trabalho infantil. Os dados mostram ainda que as crianças negras são mais as mais prejudicadas.

Segundo o relatório, a pobreza "apenas" monetária reduziu no Brasil na última década até 2015, mas as demais privações não diminuíram em igual proporção.

Entre os 32 milhões de afetados, 18 milhões (34,3%) são atingidos pela pobreza monetária, ou seja, não têm renda suficiente para comprar uma cesta básica de bens. Essa renda per capita deve ser de no mínimo R$ 346 para a zona urbana e de R$ 269 para a zona rural, segundo o Unicef. Outros 14 milhões de crianças e adolescentes, embora não sejam considerados monetariamente pobres, têm um ou mais direitos negados.

Segundo o levantamento, entre os 18 milhões atingidos pela pobreza monetária, cerca de 6 milhões (11,2%) são afetados somente pela pobreza monetária e têm os seis direitos analisados garantidos. Outros aproximadamente 12 milhões (23,1%), além da falta de dinheiro, têm um ou dois direitos negados, o que caracteriza "privação múltipla".

Somando os dois grupos que sofrem privação de direitos, são quase 27 milhões em situação de privação no país, praticamente a metade (49,7%) da população de até 17 anos.

Negros sofrem mais

Os números revelam também que os negros têm menos acessos a direitos: entre os meninos e meninas negros, a taxa de privação é de 58,3%, enquanto entre os brancos o índice é de 38%. A relação é a mesma para o percentual de privação extrema: 23,6% contra 12,8%.

Os problemas também são mais intensos no campo. O índice de privação dos que moram na zona rural é o dobro do daqueles que vivem nas cidades: 87,5%, contra 41,6%.

As regiões Norte e Nordeste concentram os maiores índices de privação direitos em quase todas as dimensões analisadas pelo estudo. A exceção fica com o item moradia, no qual o Sudeste supera o Nordeste, ficando atrás apenas do Norte.

"É preciso trabalhar mais e com maior precisão no desenho de políticas públicas e programas para crianças e adolescentes negros, com alocação suficiente de recursos orçamentários para que tenham acesso a todos os serviços, especialmente nas Regiões Norte e Nordeste, prestando atenção especial aos serviços de água e saneamento", destaca a Unicef no relatório.

Direitos negados

O direito ao saneamento é o mais negado às crianças e adolescentes brasileiros, mostra o estudo. São 13,3 milhões privados do acesso a uma rede de esgoto de forma intermediária e extrema. Em seguida, vem a educação, com 8,7 milhões.

Em relação ao saneamento, 3,1% das crianças e adolescentes brasileiros sequer têm vaso sanitário em casa. Outros 21,9% têm apenas fossas rudimentares. Entre aquelas privadas de alguma forma desse direito, 70% são negras. A situação é mais grave nas regiões Norte e Nordeste, onde 44,6% e 39,4%, respectivamente, enfrentam o problema.

Os negros também são mais penalizados quanto ao acesso à educação, segundo o estudo. Há 545 meninas e meninos negros analfabetos no país, enquanto os brancos são menos da metade: 207 mil. Dos brasileiros menores de 17 anos, 20,3% têm o direito à educação violado de alguma forma (estão atrasados ou são analfabetos), sendo que 6,5% estão fora da escola.

No quesito informação, 25,7% das crianças e adolescente não tiveram acesso à internet nos três meses anteriores à coleta da Pnad. Desses, 73% são negros.

Já quanto à privação de água, 6,8% dos menores brasileiros não contam com sistema de água em casa, enquanto 7,5% não têm água filtrada ou procedente de fonte segura. O problema é mais grave na região norte e na zona rural.

A privação de moradia afeta 11% das crianças e adolescentes brasileiros, sendo que 6,8% vivem em casas com teto de madeira e com quatro pessoas por quarto e 4,2% moram em barracos com teto de palha e cinco pessoas por quarto.

O trabalho infantil doméstico ou remunerado atinge 6,2% dos menores brasileiros. O trabalho é ilegal para menores de 13 anos, 3% das crianças de 5 a 9 anos e 7,4% daquelas que têm entre 10 e 13 anos trabalham no país. Entre os maiores de 14 anos, 8,4% (quase 1,2 milhão) trabalham mais do que as 20 horas semanais permitidas pela lei.

Entenda a classificação da privação de direitos do Unicef:

Educação

  • Privação intermediária: criança de 7 a 17 anos que frequenta a escola, mas com atraso, ou maior de 7 anos analfabeta que frequenta escola.
  • Privação extrema: criança de 4 a 17 anos que não frequenta escola ou criança ou maior de 7 anos analfabeta que não frequenta escola.
  • Informação
  • Privação intermediária: criança de 10 a 17 anos que não teve acesso à internet nos últimos 3 meses, mas tem TV em casa.
  • Privação extrema: criança de 10 a 17 anos que não acessou a internet nos últimos 3 meses e não tem TV.
Moradia

  • Privação intermediária: menor de 18 anos que vive em casa com 4 pessoas por dormitório ou cujas paredes e teto são de madeira aproveitada.
  • Privação extrema: menor de 18 anos que com mais de 4 pessoas por dormitório ou cujas paredes e teto são de palha.
Água

  • Privação intermediária: menor de 18 anos que vivem em casa com água, que vem de poço sem filtro ou fonte desconhecida.
  • Privação extrema: menor de 18 anos que vive em casa sem água.
Saneamento

  • Privação intermediária: menor de 18 anos que vive em casa com banheiro compartilhado ou fossa rudimentar.
  • Privação extrema: menor de 18 anos que vive em casa sem banheiro ou com vala a céu aberto.
Trabalho infantil

  • Privação intermediária: criança de 5 a 9 anos que fez de 10 a 20 horas de tarefas domésticas na semana; criança de 10 a 13 anos que fez entre 15 e 20 horas; e criança de 14 a 17 anos que fez entre 21 e 30 horas na semana.
  • Privação extrema: criança de 5 a 9 anos que trabalhou ou fez mais de 20 horas de tarefas domésticas na semana; criança de 10 a 13 anos que trabalhou por mais de 14 horas ou fez mais de 20 horas de tarefas domésticas na semana; criança de 14 a 17 anos que trabalhou por mais de 30 horas ou realizou mais de 30 horas de tarefas na semana.

G1

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